Da Redação
Várias são as mudanças que vêm impactando profundamente o mundo do trabalho nas últimas décadas. Desde a influência cada vez mais presente das novas tecnologias, até o surgimento de novas carreiras e o desaparecimento de outras. A pandemia acelerou muitos desses processos. Várias pessoas passaram a trabalhar em casa e precisam conciliar a comodidade de não precisarem se deslocar, com o desafio de alinhar as demandas pessoais e familiares, tudo no mesmo ambiente. Ainda não se sabe bem se estamos trabalhando em casa ou se estamos morando no trabalho.
É certo que grandes mudanças trazem sempre grandes desafios, e somente com avaliação cuidadosa e interesse genuíno em propor e fomentar melhorias no ambiente de trabalho, podemos esperar que tais transformações venham ao encontro dos anseios de termos um ambiente profissional com boa performance e sobretudo que seja fonte de gratificação e realização para os atores envolvidos.
Se, por um lado, muitas coisas estão mudando em velocidade aumentada, por outro vemos velhas práticas danosas ao desempenho profissional e à saúde das pessoas se repetindo. Nesse terreno arenoso, estéril e hostil que parece ter sempre seu lugar dentro das organizações, estão os assédios moral e sexual. É desnecessário listar os prejuízos evidentes que essas práticas trazem para o próprio funcionamento da empresa, mas é imprescindível destacar que são reflexo de consequências psicológicas e sociais graves que as práticas de assédio acarretam.
O assédio sexual no ambiente de trabalho, que majoritariamente tem as mulheres como suas principais vítimas, é caracterizado como a conduta de natureza sexual, manifestada fisicamente, por palavras ou gestos, impostas a pessoas contra sua vontade, causando-lhe constrangimento e violando a sua liberdade sexual.
A autoestima é a primeira afetada por tais práticas. A vítima tende a se desvalorizar, considerando que suas competências e habilidades não são o mais importante naquele contexto, e que sua permanência na empresa está condicionada agora a seus atributos e permissões de natureza sexual. O medo das consequências de expor a situação traz tristeza, angústia, ansiedade e pânico.
O estresse acumulado e não compartilhado, converte-se em irritabilidade e desinteresse pelo trabalho. Os prejuízos alcançam a vida privada da pessoa, causando danos nos relacionamentos com cônjuges e familiares. Muitas das vítimas sofrem com insônia, problemas de concentração e memória, o que leva o rendimento lá para baixo. Por não verem mais o desenvolvimento na carreira dependendo de suas habilidades e busca por aperfeiçoamento, é comum perderem as perspectivas e expectativas com o futuro. Configura-se assim um ambiente fértil para o desenvolvimento de quadros depressivos e, em alguns casos, o aumento de risco de suicídios.
Outra chaga que anda de mãos dadas com o odioso assédio sexual, é a natureza moral de assédio. Reproduzindo uma cultura autoritária, arbitrária, intimidadora e violenta, o assédio moral acontece em duas perspectivas: o assédio individual, referente às relações diretas do indivíduo; e o assédio organizacional, perpetrado por processos, exigências e pela cultura de gestão da empresa.
Tais relações trazem comportamentos, por parte do assediador, como: dificultar o acesso a informações, encurtamento de prazos, metas irrealistas, com objetivo de atrapalhar o desenvolvimento do trabalho da vítima, para depois culpá-la por falhas e desempenho ruins, forçando o desligamento do assediado ou mudanças de área; expor a pessoa a situações humilhantes e vexatórias; limitar a comunicação do colaborador, tornando-o mais isolado e fragilizado. Aqui como no assédio sexual, a vítima sofre um grave golpe em sua autoestima e autoconfiança, passando a se inferiorizar como pessoa e profissional. Desmotivação com o trabalho, tristeza, ataques de pânico, crises de choro, irritabilidade, insônia e depressão são algumas das consequências psicológicas mais comuns nessas situações.
Uma questão é fundamental para lidar com as duas formas de assédio, o silêncio não deve ser uma opção, pois agrava o sofrimento psicológico e suas consequências em médio e longo prazo. É natural que a vítima tenha muitos motivos para ter medo e sinta-se frágil demais para reagir a essas formas de violência.
Daí a necessidade de tomar algumas medidas preliminares que podem ajudar nesse enfrentamento: inicialmente, tente colocar algum tipo de limite para o assediador, dizendo que não aceita esse tipo de atitude; procure um colega de trabalho de confiança e compartilhe o que está se passando; tente se abrir também com alguns amigos e familiares, buscando assim uma rede de apoio que possa ampará-la nesse momento delicado; procure comunicar tais ocorrências a um superior hierárquico; se a empresa possuir uma divisão de saúde ocupacional, solicite suporte; reúna mensagens, gravações em vídeo, e-mails ou testemunhos que possam dar suporte a uma denúncia; se nada for feito no âmbito da empresa, procure os órgãos públicos e formalize uma denúncia; procure ajuda psicológica e psiquiátrica se notar que alguns dos sintomas relatados acima estão presentes.
É importante lembrar que os diferentes tipos de assédios fazem o indivíduo adoecer, o que diminui seu rendimento, seu interesse pelo trabalho e pela carreira. Ao ser cúmplice de tais práticas nefastas, perde muito a empresa, seja por desumanizar as relações, seja por ver a produtividade cair. Sobretudo, perde toda a sociedade, por reproduzir, insistente e permanentemente, práticas perversas que rebaixam e humilham as pessoas, tirando delas sua dignidade e o direito de sonhar e participar da construção de um mundo melhor.
Se você está sendo vítima de assédio, peça ajuda, busque apoio, encoraje-se e denuncie. Se você pode ajudar o(a) colega, una-se a ele, ofereça suporte, testemunhe. Em todos os lugares haverá pessoas que tentarão confiscar nossa humanidade e dignidade, e somente a união corajosa diante de qualquer abuso, é que tem potencial para restaurá-las.