CAIXA, um bem público na vida das pessoas.

Eu era feliz e sabia… O que se tornou a vida do empregado Caixa nos últimos 4 anos?

Por Milo Silva*

 

Parece que foi há mais de uma década que o clima no país azedou. Com o resultado do segundo turno da eleições de 2018, uma névoa escura cobriu o céu e, muito que coincidentemente, o humor se deprimiu. Não só o meu, mas o de meus colegas. Janeiro de 2019 chegou com rumores vindos da matriz de que passou a ser proibido usar gravata de cor vermelha ou qualquer tom de carmim, bandeirinhas do Brasil foram fincadas nas divisórias das mesas dos empregados, trazendo uma brisa patriótica que nunca havíamos experimentado antes, tinha um gosto amargo de opressão.

Quem ousou aparecer de gravata vermelha nunca mais foi visto nas cenas das reuniões, em que cada vez mais era composta por pessoas diferentes, um troca-troca de peões exatamente como num jogo de xadrez; a diferença é que nesse tabuleiro não tinha bispo ou rainha, apenas o rei e seus cavalos. Saiu nos jornais que um dos novos diretores da nova gestão era, antes de ser indicado para a função, personal trainer do rei do jogo. Apesar de nunca ter atuado na área de finanças ou qualquer coisa relacionada a banco, o antigo personal tinha o “perfil necessário”: era um ótimo cavalo para seguir os comandos do rei. E, assim como ele, aos poucos mais cavalos foram chegando para ocupar postos onde antes tinham peões que atuavam nas áreas em que estavam há muito tempo.

Conhecimento, capacitação e formação na área foram substituídos por “atender ou não ao perfil buscado”, perfil esse que nunca definiram, nem explicaram, mas que a rotina mostrou que tinha a ver com ser cúmplice de atitudes erradas como assédio moral e sexual, que eram tratadas à base de silenciamento e abafamento de casos. Esses cavalos faziam o monitoramento de toda sujeira deixada pelo rei, jogavam tudo pra debaixo do tapete para que aparentemente tudo parecesse normal. O cheiro e a temperatura, no entanto, denunciavam que os tempos já eram outros e colegas não falavam mais com vontade, de forma espontânea; ao contrário, cochichavam, conversavam em tons mais baixos pelos cantos, nas copas, nos banheiros e sempre com receio.

“Paredes, pilastras e carpetes têm ouvidos”. Tem quatro anos que escuto isso e, sinceramente, gosto de lembrar de quando não era assim. Tenho saudade de como minhas lembranças trazem a Caixa na minha vida. Meus colegas sorriam mais, tinham mais ânimo; hoje eles têm mais medo e desmotivação do que coragem para falar o que pensam. Em lugar algum isso é ou deveria ser normal, aceitável. Eu era feliz e sabia e até colegas que reclamavam dos tempos de antes passaram a concordar comigo. A Caixa já foi mais mãe do que essa figura de tutora alheia a seus próprios filhos que passou a ser desde janeiro de 2019…

Dizem que tudo passa, mas certas situações não deveriam ter acontecido e suas sequelas vão demorar a passar, por mais que troquem o rei por uma rainha, por mais que finjam que essas coisas são facilmente esquecíveis. Não podemos esquecer. Temos que relembrar o passado para construir um futuro melhor. E não queremos mais um jogo onde rei, rainha e cavalos pisoteiem dolorosamente peões todos os dias e que isso seja desmentido com cartas de demissão farsantes e notas escritas por advogados à imprensa igualmente farsantes. A gente vale mais que isso. A Caixa vale mais que isso.

 

Milo Silva é o pseudônimo de um bancário. Ele assina com esse nome, pois é a única forma de garantir que não sofra perseguição.